terça-feira, 8 de outubro de 2013

SILÊNCIO


A finitude é casa humana comum na qual mora Deus, fonte criadora, poesia.


Silêncio poético!

barulho nem sempre expressa o que de mais agudo existe no mundo dos homens. Palavras, ritmos agitados, passos inquietos podem apenas ser sinais incompletos de fontes mais profundas. No silêncio é que moram os mistérios dos dizeres. Por detrás das representações, habita germe sagrado, sopro vital e de sentido inesgotável. “Não dito” que acompanha, feito penumbra, nomes de pessoas e coisas. Infeliz de quem somente aprendeu e se acostumou com a fala corriqueira, com aquilo que todos comentam. São repetidores; não sentiram a beleza de uma palavra nova, quando nasce. Não sabem o que é poesia. Tornaram-se viciados em vocabulário, não suportando calar a voz para uma escuta mais atenta.

Palavra bem dita, que não é apenas repetição, deve ser gerada em solidão. Quieta, germina a semente; na espera, cresce a criança; no vazio, nascem linguagens. Somente quem aprendeu a estar sozinho, na imensidão da existência, pode saborear arte e criar. Dom grande, que Deus dividiu com seus filhos, foi o da poesia. Ele, poeta maior; o homem, imagem, parceiro de obra. Diante de crises, da ferida aberta, da impotência do logos, ou se cria, ou se perde. Todavia, a criação não chega depressa. Tem que ser atentamente modelada e com esmero. Por vezes, não sem sofrimento. Em terreno de gente, novidade só chega quando há despojamento. Quando a flor desabrocha, feito metamorfose, é porque já abriu mão de roupa velha.

Que grande poeta, Jesus de Nazaré! N´Ele, tudo renova-se, na acolhida do avesso das aparências. Pobres, pecadores, doentes são vistos sem clichês. Jesus enxerga o coração, acolhe a pessoa mesma. Em sua kênosis, na ausência de qualquer ilusão, deixa claro que somente o espírito enche as coisas de beleza e não as pretensões onipotentes. Por isso, ensina que é feliz aquele que, perdendo voz e vez, mantém-se na confiança amorosa. Aliás, sua cruz redentora salva porque revela que a fraqueza, em Deus, é forte. De alguma forma, decreta, assim, que todo amor verdadeiro é impotência, frágil, mas divino porque alimenta-se de céu, único lugar de onde pode vir o milagre que salva.

Então, companheiro, que poesia habita seu silêncio? Não deixe morrer a profundidade humana que o alto lhe concedeu. Mas cuidado porque, depois de grande, é preciso renascer menino. Lembre-se de que no lago da existência não moram somente certezas, já conhecidas. Há também o inominável que, quando aceito, faz gerar coisas novas; quando recusado, causa tormento. E mais, não fuja da dor de si mesmo e nem recuse os sofredores da história. Caso isso aconteça, o melhor da humanidade despede-se, deixando a curta existência sem sentido. Afinal, a finitude é casa humana comum na qual mora Deus, fonte criadora, poesia silenciosa.

Pe. Vicente Ferreira, C.Ss.R.
Superior Provincial


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